Uma das boas histórias do Eudes é a do passeio de bicicleta
com seu amigo Geraldo Francisco, parceiro de aventuras da juventude. Ouvi
conta-la inúmeras vezes quando criança e
vou tentar reproduzi-la da forma que a memória me permitir.
Eudes e Geraldo Francisco tinham 16 ou 17 anos em Sete
Lagoas, companheiros de todas as horas, tal como na brincadeira em que os dois
simulam uma luta na foto abaixo. Certo dia resolveram fazer um passeio de
bicicleta nos arredores da cidade. Geraldo tinha bicicleta nova e Eudes
conseguiu uma emprestada. Passeio acertado, bicicletas em ordem, horário marcado
para se encontrarem no dia seguinte.
Apenas um pequeno detalhe foi esquecido: onde iriam se
encontrar para iniciar o passeio. Estavam tão alinhados no espírito da aventura
que não se lembraram de combinar quem passaria na casa de quem.
No horário combinado, com a pontualidade de amigos ansiosos
pela aventura e que não queriam deixar um ao outro esperando, saíram ambos de
suas casas em direção à do outro. Geraldo, mais pragmático, foi pelo caminho
que julgava mais curto e direto. Eudes tomou um caminho menos óbvio, dando a
volta pela lagoa, talvez para aproveitar um pouco mais a bicicleta emprestada.
Chegando à casa de Geraldo, Eudes ouviu que o companheiro
havia saído a pouco para encontra-lo em sua casa. Geraldo ouviu a mesma
história na casa de Eudes. De imediato ambos perceberam que a escolha de rotas
distintas impedira o encontro no meio do caminho. A convivência constante fez
com que tivessem o mesmo pensamento diante da situação: o melhor a fazer seria
voltar pelo caminho feito pelo outro, na tentativa de se encontrarem e partir
definitivamente para o destino combinado no dia anterior.
Eudes pedalou velozmente e, ao chegar de volta à sua casa,
ouviu, mais uma vez, que Geraldo havia passado por ali e tinha voltado para
encontra-lo pelo caminho da lagoa. Estavam girando em círculos um atrás do
outro! Só havia uma coisa a fazer, voltar para a casa do amigo, desta vez com a
recomendação expressa aos de casa: “se ele chegar aqui, não o deixe sair que eu
volto e nos encontramos”.
E mais pedaladas velozes pelo caminho da lagoa. Entretanto,
aquele era o dia do incrível acontecer. Quando Eudes chegou na casa de Geraldo,
ouviu de seus familiares o mesmo recado: “ele disse para você esperar aqui que
ele volta para encontra-lo”. Obedecer não era o forte do Eudes, mas se ele
fizesse isso, e seu amigo mais comportado fizesse o mesmo, eles iriam ficar
parados cada um na casa do outro esperando e não iriam se encontrar. Não: nessa
era pré-celular, o melhor era voltar para casa e confiar que Geraldo tivesse
ficado esperando.
Não foi o que aconteceu. Geraldo também não ficou para
esperar e voltou pelo outro caminho, na esperança de que, a esta altura por
puro acaso, Eudes tivesse ficado esperando. Mais um giro em círculos.
Ao descobrir o novo engano, o incômodo desencontro se
tornara cômico. Enquanto o tempo passava nessas idas e vindas, o passeio
planejado na véspera a esta altura já estava comprometido. O esforço agora era para tentar, pelo menos,
rirem juntos.
Não sei quantas voltas deram, sempre alternando caminhos na
ordem inversa, impedindo sempre que se encontrassem. Os familiares de cada um
já participavam ativamente do desencontro, dando palpites sobre o que fazer:
“espere aqui que ele volta”, “tome o outro caminho, pois ele veio por lá”.
Alguns conhecidos pela rua também tinham percebido o que estava acontecendo e
gritavam incentivos: “vai mais rápido que você o alcança”, “ele acabou de
passar por aqui”.
Quis o destino que, cansados pela velocidade das pedaladas,
ou distraídos do caminho pela concentração na tentativa de encontrar o outro,
trombaram as bicicletas em cheio numa esquina. Foram ao chão juntos com as
bicicletas enroscadas uma na outra pela intensidade do choque. Eudes sempre
terminava a história gargalhando, como disse que o fizera no dia do episódio,
enquanto Geraldo, preocupado com os danos em sua bicicleta nova, tentava
concerta-la para conseguir voltar para casa.